Falando em desapego...
Alguns amores modernos me assustam. Esses amores efêmeros,
frágeis, superficiais. Esses amores que destoam assombrosamente do que um dia
já pudemos, com todas as letras e toda a certeza, chamar de amor.
Somos a geração das selfies, do beijinho no ombro, do rei do
camarote, do “promova o desapego”. A geração do egocentrismo cego. É tanta
mediocridade que o amor genuíno arrumou suas trouxas e foi-se embora.
A verdade é que vivemos relações descartáveis. E se num dia
o amor parece transbordar pelos poros, converte-se, vertiginosamente, em ódio
ou desprezo, no momento em que a atração termina ou surge uma mínima mágoa.
Ninguém ama o outro depois que a relação deixa de ser
conveniente. Pior do que isso, alguns não conseguem expressar sequer a mínima
humanidade em relação àquele que julgou amar um dia. Ninguém quer que o outro
seja feliz em outros braços – alguns preferem, aliás, vê-lo mendigando afeto,
chorando de saudade, lamentando o fim da relação. O egocentrismo grita alto e
ordena que, se o outro consegue superar o fim do relacionamento, devemos nos
sentir diminuídos. Que desejar a felicidade do outro é incompatível com buscar
a nossa própria felicidade. O egocentrismo cego nos diz que temos que mostrar
que não nos importamos, que somos felizes e desapegados. Que temos que sorrir
cada lágrima do ex.
Nesse oceano de modernidade, é bom lembrar que não são os
amores não duráveis que me assombram; compreendo que a cada um assiste o
direito de trocar de parceiro como quem troca de roupa, se isto lhe faz feliz.
O que me assombra é a capacidade humana de converter amor em ódio, o bem querer
em desprezo, o apego em maldizer. É a velocidade com que fotos românticas são
substituídas por indiretas ácidas, e declarações de amor por palavras amargas e
cheias de mágoa.
Temo que a geração do egocentrismo já não saiba amar nada
além de si mesma. Temo que tenhamos desaprendido a, simplesmente, querer bem. A
manter o respeito pelo outro quando o próprio amor já não existe. Temo que
ninguém mais consiga elevar seu espírito de tal modo que o desapego passe a ser
uma consequência, e não uma busca implacável, uma mentira deslavada que
contamos para nós mesmos.
E que sejamos nobres o suficiente para querer bem ao outro
sem que precisemos esfregar a nossa felicidade na cara de ninguém. Que cada um
compreenda que estar de bem com a gente mesmo é o que importa, no fim das
contas, e que querer ver o fiasco daquele que um dia já nos fez feliz não é
exatamente uma atitude madura. Pior do que isso: é mesquinho. E que o fato de
amarmos – no sentido humano da palavra – a quem nos fez sofrer por um instante
não significa que não amamos a nós mesmos. Às vezes, pode significar justamente
o contrário:Por que só distribuímos o que temos de sobra. E que um dia se possa
compreender que o amor genuíno nunca deixa de existir: ele só muda de forma.
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